sábado, 28 de julho de 2012

Deputados de cabresto


O beija-mão de deputados federais recebidos por Valdemiro Santiago e divulgado pelo Genizah (vídeo abaixo) é um daqueles episódios grotescos que mostram o quanto a pregação de certos líderes religiosos é muito mais ideológica do que teológica. Diga-se de passagem, pra começo de conversa, que não são todos deputados evangélicos, já que há um maranhense que se apresenta como “católico” no meio, embora o seu padre ou bispo não deva saber disso, se é que ele frequenta alguma paróquia que não a do Sarney.

Por sinal o apoio do deputado Waldir Maranhão não é lá muito firme, já que ele corre o risco de ter omandato cassado por irregularidades na sua campanha, o famoso “caixa 2”. É que ele gosta tanto, mas tanto de servir ao povo que prestou contas dizendo que vendeu um imóvel de 600 mil reais para financiar a sua eleição, e “torrou” toda a grana na campanha, quando a lei o autorizava a gastar apenas 10% do valor. Deve ser por isso que ele chamou Valdemiro de “homem alegre e festivo”, já que 10% é um número mágico para os ouvidos do “apóstolo”, se bem que ultimamente ele está mais chegado no “trízimo” (30%).

De qualquer maneira, o vídeo é uma aula sobre como funciona a política (e a manipulação) religiosa no Brasil.

Primeiro, por mostrar que os latifundiários da fé veem seu rebanho como um verdadeiro “curral eleitoral”, que ainda que não respeite tanto seus líderes nas eleições majoritárias (para o poder executivo), não titubeia ao segui-los fielmente quando se trata de eleições proporcionais (para o legislativo). E aí não importa a sigla partidária, desde que os desejos do líder sejam satisfeitos.

Segundo, por deixar claro que deputados não se elegem de acordo com convicções doutrinárias ou os objetivos dos crentes que votam neles, mas para servir um guia religioso a quem juram lealdade. São os famosos “deputados de cabresto”. Serão fiéis pelo menos até o momento em que os seus interesses pessoais são contrariados (ou se convertam ao Deus verdadeiro).

Terceiro, por escancarar que essa rede de apoios navega ao sabor das marés políticas e dos conchavos de ocasião. Valdemiro não reuniu os deputados pelo “amor ao evangelho”, mas para oferecer a eles a possibilidade de amealharem os votos potenciais do seu curral eleitoral, bem como mostrar às autoridades constituídas que ele “tem bala na agulha” e pode – eventualmente – confrontar a bancada do arqui-inimigo (e “irmão”) Edir Macedo e barganhar qualquer coisa na bacia das almas da chantagem eleitoreira.

Quarto, pelo silêncio gritante das ausências. São só esses os congressistas que apoiam Valdemiro contra Edir? Um dos deputados traz “de boca” o apoio do senador Magno Malta, que não compareceu ao conchavo encontro, mas mandou dizer que apoia Valdemiro. Um apoio assim, digamos, meio envergonhado e medroso, já que ele não quer se indispor com os outros "irmãos" Edir Macedo e Silas Malafaia, este último de quem é mais próximo.

Quinto, por revelar que os deputados estão ali para atender interesses particulares, os seus e os de Valdemiro, e não os anseios maiores do povo que dizem representar.

Por fim, é claro que os evangélicos, a exemplo de outros segmentos da população brasileira, merecem e devem ser representados em todas as instâncias políticas, uma situação salutar para este sistema imperfeito que é a democracia (mas até hoje não inventaram nada melhor). Não podem, contudo, querer transformar o país numa teocracia do tipo iraniano.

Deviam, inicialmente, ter respeito pelo nome “evangélico” e pela magnitude do seu significado, não o misturando com os golpes mais baixos da política. Além disso, mesmo sendo evangélicos, não poderiam esquecer jamais que são servidores públicos, e - como o próprio nome diz e nunca é demais relembrar - é ao interesse público que devem servir, da mesma maneira que todos os demais representantes de outros partidos e comunidades.

Entretanto, parece que está distante o dia em que eles perceberão isso. Na verdade, até já perceberam, mas não praticam, principalmente porque a religião – quando mal usada – é um excelente refúgio para os mais baixos instintos.

Enquanto este dia não chega, só resta aos verdadeiros evangélicos orarem e votarem melhor.


Fonte: O Contorno Sombra

Nenhum comentário:

Postar um comentário